Congresso tenta voltar o financiamento privado de campanha eleitoral


Deputados devem enterrar a ideia do financiamento público proposto na reforma política que tramita na Câmara

O Congresso quer, agora, ressuscitar o financiamento privado de empresas em campanhas eleitorais — prática proibida em 2015. Apesar das denúncias, prisões e condenações da Operação Lava-Jato e das suspeitas de caixa 2 disfarçado de contribuição, deputados devem retomar o assunto e enterrar a ideia do financiamento público proposto na reforma política que tramita na Câmara e deve começar a ser votada hoje. A dúvida é se os próprios deputados estabelecerão as regras para doação ou deixarão o assunto para os senadores decidirem na Proposta de Emenda Constitucional que tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.

Os ventos que sopraram do Senado para a Câmara na última semana desanimaram os deputados. A ideia inicial era aprovar um Fundo Eleitoral, calculado a partir de 0,5% da Receita Corrente Líquida do país, e somar R$ 3,6 bilhões. O valor foi considerado alto e os defensores da proposta desidrataram para R$ 2 bilhões. Ainda assim, as críticas minaram a intenção e a sugestão foi para que a Câmara aprovasse, simplesmente, sem definição de valor e origem, deixando o anúncio para quando o Orçamento Geral da União fosse aprovado em dezembro.
Diante dos conflitos, senadores emitiram sinais inequívocos de que o debate seria em vão. Na semana passada, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Jader Barbalho (PMDB-PA) almoçaram com o relator da proposta, deputado Vicente Cândido (PT-SP), e avisaram que o Senado derrubaria o fundão. “De que adianta nós aprovarmos se os senadores ficarão com o discurso de que não aceitaram tirar dinheiro da saúde e da educação para financiar campanhas eleitorais?”, lamentou um líder partidário da Câmara.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), entendeu o recado e recolheu os flaps já na semana passada. Alegando que o quórum estava baixo — havia 430 deputados em plenário — suspendeu a sessão e transferiu a votação para esta semana. “Enfrento muita resistência ao financiamento público dentro da bancada do PMDB”, admitiu o líder do partido na Câmara, Baleia Rossi (SP). Maia afirmou ontem que, com a atual situação fiscal do Brasil e a necessidade de se cortar gastos públicos, será difícil tirar R$ 3 bilhões dos cofres públicos para financiar campanha. Para Maia, a eleição de 2018 “certamente” custará um terço dos R$ 7 bilhões do pleito de 2014. “A maioria dos políticos entenderá que vivemos em outra realidade na política e na democracia brasileira. Mesmo assim, ainda será preciso financiar R$ 2,5 bilhões”, ressaltou.
Com tantas críticas ao fundão, a classe política empolgou-se após declarações dadas pelo juiz Sérgio Moro, dizendo que, desde que houvesse regras claras, não haveria problemas para o financiamento privado. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux também defendeu uma volta do modelo desde que a empresa não doe para mais de um candidato. O líder do PT na Câmara, Carlos Zarattini (SP), afirma que a classe política quer ressuscitar um tema que não faz mais sentido. “As empresas já decidiram que não vão passar mais um cheque para os partidos políticos”, declarou. Após os deputados analisarem a reforma política, o texto seguirá para a análise dos senadores. Já a proposta que está na CCJ do Senado não retornará à Câmara. O relatório chegou à comissão em 18 de agosto e o presidente do colegiado, Edison Lobão(PMDB-MA), anuncia o relator hoje para, assim que o texto estiver pronto, colocá-lo na pauta de votações.

“Semipresidencialismo”

Em evento no Palácio do Planalto, o presidente Michel Temer afirmou que a proposta de implantar no Brasil o semipresidencialismo, um modelo no qual, apesar de haver um primeiro-ministro, o presidente mantém a força política, seria “extremamente útil”. O modelo é adotado na França e em Portugal, por exemplo. “Não adianta instituir um parlamentarismo em que o presidente é fraco”, comentou. Temer tem debatido o assunto com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e com o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE).
O presidente reconheceu a complexidade do debate e, por isso, absteve-se de comentar se a proposta poderia valer já para a próxima eleição. “Aí vamos precisar conversar, porque depende de uma mudança constitucional grande. As discussões estão começando agora”, justificou. Temer aproveitou a oportunidade para criticar a maneira como a imprensa trata os encontros que mantêm com o ministro Gilmar Mendes. Ele comentou que “sempre” se encontra com Mendes para discutir política. “Aí vocês publicam: ‘encontrou-se tarde da noite’. É que o presidente trabalha até meia-noite”, disse.

A volta do que já era

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que altera o sistema eleitoral
brasileiro está pronta para ser votada no plenário da Câmara. Confira o que
deve ser analisado pelo plenário:
 » Financiamento
Depois de muitas reviravoltas, a tendência, agora, é a aprovação de um financiamento privado, com regras específicas, que poderão ser definidas na Câmara ou no Senado. Parlamentares defendiam a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia para as campanhas.
A ideia, contudo, foi mudando. Primeiro, os recursos do fundo viriam de 0,5% da Receita Corrente Líquida do país durante 12 meses, que somaria um valor estimado de R$ 3,6 bilhões. Depois, a cifra caiu para R$ 2 bilhões. Por fim, o fundo seria somente aprovado e origem e recursos definidos no orçamento aprovado em dezembro.
 
 » Distritão
A proposta também gera muita polêmica e pode ser derrubada em plenário, embora boa parte dos líderes apoiem a ideia. Atualmente, deputados federais, estaduais e vereadores são eleitos
no modelo proporcional com lista aberta. Os votos dos candidatos da coligação são somados
e a quantidade de vagas daquele grupo é referente ao número — o quociente eleitoral. Com a aprovação do distritão, os mais votados são eleitos e não se leva em conta os votos dos partidos ou das coligações.
 
 » Eleições de 2022
A proposta é que o distritão seja uma transição para o distrital misto a partir de 2022. No sistema, os eleitores votam duas vezes, uma no candidato do distrito e outra no candidato escolhido pelo partido. Metade das vagas vai para os mais votados e a outra metade é composta por integrantes de uma lista partidária.
 » Doação de pessoa física
Atualmente, segundo resolução do Tribunal Superior Eleitoral, “as doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% dos rendimentos brutos auferidos pelo doador no ano-calendário anterior à eleição” e só podem ser feitas por meio de transação bancária na qual o doador seja obrigatoriamente identificado. Destaque aprovado na comissão redefine o valor de doação para
R$ 10 mil e permite o anonimato do doador, medida que o Ordem Nacional dos Advogados afirmou que questionará na Justiça caso seja aprovada.
 
 » Mandato nos tribunais superiores
A ideia é acabar com os cargos vitalícios de membros dos tribunais superiores. Ministros do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, terão mandatos de 10 anos. Juízes dos tribunais eleitorais ficarão quatro anos nos cargos.
Fonte: Correio Braziliense

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