Acabar com o São João é apagar FOGO com gasolina


“Nosso amor que eu não esqueço, e que teve o seu começo numa festa de São João, 
morre hoje sem foguete, sem retrato e sem bilhete, sem luar e sem violão”.  (Noel Rosa)

 

Tradição não se deleta. Cultura é a essência vital de uma sociedade, onde o processo cultural e identitário complementa nosso DNA SOCIAL.

Extremamente enganados estão àqueles que se deixaram imaginar que a cidade de Estância produz fogos de artifícios. Os estancianos historicamente produzem uma das mais belas expressões culturais do Brasil e não é pirotécnica!

A mesma terra que pariu Gumercindo Bessa, também deu graças ao camandante do majestoso Barco de Fogo, Chico Surdo. Esta é a mesma terra que fez nascer Félix Mendes que retratou com maestria e profundidade os nossos festejos em suas telas, é a cidade dos astutos pescadores dos bairros Porto D’Areia, Botequim, Santa Cruz e Bomfim para criarem o desobediente e magnífico pincel de fogo, o Buscapé. Essa é a mesma Estância, terra que Jorge Amado escolheu para escrever seus mais belos roteiros literários, aqui é também terra que têm os batuques… das batucadas, do pisa pólvora, das ruas enfeitadas com fogueiras e muita alegria, é a terra da magia que encanta e irradia todos os que por aqui vem festejar.

A Capital e terra natal do Barco de Fogo é também uma terra de gente hospitaleira, cortez e gentil, mas, não se engane é também terra de um povo valente, ordeiro e viril. Terra de gente que não se rende, que não se vende e não desiste de ir à luta, apesar de ter nome de estância não se abaixa para usar canga, pois o pescoço desse povo já nasce curto para não suportar tal insulto.

O nosso fogo não pode ser confundido ou tipificado como mero elemento pirotécnico (repito). O código de barras do nosso fogo são as digitais nas mãos dos nossos fogueteiros, a bula não está em memórias virtuais ou chips, os ingredientes não são misturados em formas ou maquinários de última geração, nossa massa é forjada no bater do pilão, a robótica nessa arte não consumirá a preciosidade que temos no encher, no socar, no amarrar e no soltar.

A Lei ou a interpretação da mesma não pode ser exercida sem a devida responsabilidade com o seu povo, aqueles que não conhecem a mística do nosso festejo precisam ter a sensibilidade e sagacidade para blindar o que há de mais belo no ser humano, a sua raiz. Pois, sem raiz não existe caule, sem caule não existe flores e sem flores não teremos o amanhã.

O abuso de poder se concretiza quando passamos a exercer uma autoridade fora da medida, isso acontece quando exageramos nas doses de disciplina ou quando provocamos marcas irreparáveis no outro. O abuso aqui não será aceito, podem experimentar numa outra cidade, porquê Estância não se dobrará aos caprichos de meras letras impressas em pálidas folhas de papéis.

A tradição é a identidade molecular da alma e do espírito do povo da terra de Rogério Cardoso. Estância tem um São João diferente de todo o Brasil, essa diferença está fixada na iris dos que vêem o baile do nosso buscapé e às ondas de fogo do nosso barco. É essa a diferença que faz o seu povo resistir a tudo e a todos sempre na perspectiva da manutenção de suas tradições em consonância com a contemporaneidade.

Já vi de tudo na terra do buscapé, mas, nunca vi prosperar nenhuma ideia que possa diminuir a paixão dos estancianos pelo seu São João. Para nós, proteger nossos símbolos culturais é uma causa pétrea, irrevogável em nossa carta magna, essa, que fora escrita nas calçadas e platibandas em toda nossa cidade. Seus artigos e capítulos da constituição municipal a qual me refiro foram simplesmente escritos por homens e mulheres que produzem um dos mais belos espetáculos do mundo, o ‘Espetáculo do Fogo’.

Não adianta. Toda vez que algo e/ou alguém quer ofuscar o brilho do nosso São João ele ressurge como um vulcão enfurecido. Aguardem…, esse ano não terá só fogo no beco…vai ter fogo, vai ter rojão, vai ter luz e muita emoção da rua Nova ao Abaís, da colônia Estancinha ao Farnaval, da Cidade Nova ao Alecrim, do Porto D’Areia ao Bomfim da rua da Bahia ao Botequim.

Assim é o meu povo estanciano. Assim e a nossa estancianidade.
Estância que não se curvou às mordaças da ditadura, não apagará jamais a sua chama de autenticidade do mais puro e tradicional São João do Brasil.

Viva os maestros do fogo!

Estância é FOGO, tradição e paixão!

Por Mario Dias

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