O POETA GRITA E A POESIA ACORDA


Ontem à noite conversei com a minha mãe sobre os símbolos e as potencialidades do poeta. Ela, também artista e profissional das letras, destacou a poesia como elemento fundante, em outras palavras, ela me disse que a poesia é o sentir-linguagem que inaugura e possibilita que a arte exista. Em acordo, citamos que sem os apelos poéticos pouco se pode dizer e fazer; até porque é preciso do tempo-compasso do verso para a melodia nascer; é preciso da contemplação e labor poético para que a arte se torne tangível. Acrescento que, até para descrever uma dor usamos artifícios poéticos. Sobre isso, abro aspas para o poema “Dor elegante de Leminski” que nos diz: Um homem com uma dor /É muito mais elegante / Caminha assim de lado / Como se chegando atrasado / Andasse mais adiante/ Carrega o peso da dor/ Como se portasse medalhas/ Uma coroa, um milhão de dólares/ Ou coisa que os valha/ Ópios, édens, analgésicos/ Não me toquem nessa dor/ Ela é tudo o que me sobra/ Sofrer vai ser a minha última obra.

Gosto de usar esse poema como ilustração de que a linguagem poética é ampla, nela cabe à dor, o drama, o riso, o desespero, a vida. Todas essas descrições despercebidas, mas tão exatas quando lidas e sentidas, só existem porquê existe o sujeito que as escreve. A este, damos o nome de POETA. Ontem, 20 de outubro, dia do agente das rimas, senti a falta de grandes celebrações. Imagino que no dia do poeta todas as pequenas e grandes coisas deveriam importar; tudo deveria ser conteúdo para os versos, porque tudo, finalmente, seria mais latente: O brilho do sol, a melindrosa noite e o oculto dos nossos desejos. Queria também que próprio poeta existisse em seu dia, que fosse, por fim, enxergado, celebrado e respeitado. Pessoalmente e coletivamente, nós, os artistas, estamos galgando o direito do prestígio, o direito da potência que tem o nome no fim da página, certos de que, a escrita poética educa a viver, educa a sentir, educa a olhar para si e para o mundo de forma mais corajosa e sensível. O poeta grita e a poesia acorda – e isso é urgente. Assim como versa Mário Quintana: “Quem faz um poema salva um afogado”. Então, respiremos, caros leitores, a poesia e os poetas continuarão a existir.

Thalita Síntique

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