Porque os sinos dobram



Motivados pelo fazer cultural e a sua necessidade de expressão, jovens talentosos atores, exibem a mais autêntica arte teatral de qualidade e esmero, em três espetáculos históricos na cidade ‘berço da cultura’ por titularidade e tradição.
A sociedade dos Incautos, em sua estancianidade, debruça-se sobre textos e temáticas que oportunamente levam à reflexão e entendimento, os momentos vividos na nossa sociedade. ENTRE ELAS é a porta de entrada de situações que nos aproximam de toda veracidade e discurso; é a lei ditando normas e a sociedade se reprimindo em suas entranhas, fechando os olhos da obviedade que nos apavora. A homofobia está entre os destaques mundiais no Brasil, que é o pais que mais mata homossexuais e lésbicas, que extirpam trans e negam seus direitos. Tendo como referência o conto de Conceição Evaristo DO LADO DO CORPO UM CORAÇÃO CAÍDO, a acadêmica Thalita Síntique (AEL), tece uma trama engenhosa, esculpida numa dramaturgia madura e moderna para expor tudo aquilo que pensamos e não temos coragem de dizer. Ela diz de forma contundente e as atrizes Thaylane Aragão, Vitória D’almas, Shara Gabriella, Fanny Lima, Claudia Ferro a própria Thalita, somadas ao convidado especial Luiz Souza, deslizam de forma magistral, toda uma exposição de corpos, sentimentos e verdades que alinham o despertar do outro nessa grande colmeia que é a nossa sociedade. Com produção de Cláudio Hiroshy e uma codireção inteligentemente bem pensada e sem medo de Paulo Ricardo e Thalita, que levam o expectador a uma experiência nua e crua de um preconceito velado, de uma violência que explora de forma explícita e inferioriza o segmento LGBTQIAPN+.
A segurança dessas jovens atrizes é espetacular a ponto de querermos ver suas interpretações inúmeras vezes, tamanha suas verdades cênicas exibidas durante o desenrolar da trama.

A morte violenta de Dudu, um homossexual que aventura-se nas artes visuais e show business, depois de anos reúne seis amigas de comportamentos e vivencias diferentes na sala de uma casa de classe média. Daí o olhar curioso do público, que apavora-se e encanta na narrativa apresentada.
Toda essa sinfonia cultural poderia ser muita mais experiente e furtiva se não fosse a falta de espaços oportunos para as artes cênicas, que de forma reduzida e amadora apropriam-se de espaços outros para que a cena nunca deixe de pulsar e se permita acontecer. Essa coragem vertiginosa, vivida por nossos artistas, diz da omissão pública numa cidade explicitamente cultural e historicamente assim batizada, que traz em sua bandeira, como lema em seu brasão, CULTURA E TRABALHO. O que entendemos de tudo isso? O que pensamos e entendemos de políticas culturais de fomento, o que de fato fazemos por nossos artistas e de que forma os valorizamos? Será que o pagamento de módicos cachês é o suficiente para a sobrevivência da cena?
Vamos retroceder no tempo e revisitar nossa história em um espaço que o nosso berço cultural era palco de intelectuais e artistas de todas as áreas, uma tradição que por pertencimento nos abraçou como legado e nos faz gritar e se aproximar do belo, numa catarse que poucos entendem mas sentem a cada repique do tambor da nossa batucada, do rabeio do nosso buscapé, do brilho cintilante do nosso barco de fogo, do raiar da nossa literatura, da voz eloquente dos nossos cantores e dos gestuais épicos e modernos dos nossos atores.
Sentimo-nos orgulhosos dessa missão e entristecidos porque a cada pleito as promessas surgem como esperança e o esquecimento logo perdura-se de forma inocente ou maldosa, não sabemos…
Mas como falar de arte se as nossas autoridades não frequentam esses espaços culturais. Como falar de arte se a nossa população não têm livre acesso a ela?
Numa cidade multicultural como Estância, quando tivermos uma orquestra sinfônica a se apresentar ou um grupo de ballet de repertório para que pudéssemos consumir arte de caráter mundial? Isso também é um processo de educação. Se não temos esse espaço como poderemos agregar valores dessa natureza?
São poucos os políticos que se aventuram a entender o fazer cultural com sensibilidade e entendimento; e de fato trazer um discurso eloquente que faça-nos ouvir nas ruas e tribunas. O que vemos é outras cidades sem que tenham tanta tradição cultural avançando a passos largos em suas conquistas e espaços, e nós, que bradamos tanto em nossos discursos politiqueiros ‘CULTURA’, não a entendemos em extensão e favorecimento. Esquecemos que ela é também, trabalho e economia criativa, que movimenta milhares de dólares nesse mercado informal e como tal, necessita de seus espaços apropriados, intercâmbios, fomentos através de editais municipais, vivências culturais de excelência. Nessa movimentação constante continuaremos fluindo e invadindo os espaços outros daqueles que acreditam nas artes como elemento transformador da nossa sociedade e quem sabe assim, de fato, seja levada à sério, às promessas e a necessidade da construção do nosso teatro municipal, que há muito aguardado e tão simbólico para a nossa cultura de raiz. É preciso fazer pulsar a cena no seu templo sagrado para que nós estancianos, possamos consumir a arte estanciana, sergipana e nacional com qualidade e respeito e por falar nele os nossos aplausos respeitosos de gratidão à todos aqueles que acreditam e fazem valer a nossa arte.

Dito isto, preparem-se para as nossas próximas invasões culturais: O MOINHO DAS ÚLTIMAS HORAS,
KARKAÇA – O ÚLTIMO VOO HUMANO, CORREIO FEMININO e BELA FLOR.

Por Adonnys Diniz

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  1. joildo dante santana disse:

    Nobre Adônis a sua crítica e reflexão nesse lindo e acertivo ensaio me fizeram admirá-lo mais um tanto..

    Havia muito que o fazer cultural em Estância /Se, qdo impregnado por bajuladores e secretários incompetentes nunca vislumbrou quebrar a quarta parede da sua natural grandeza Teatral… Ficou no passado em primeiro ato nas intransponíveis coxias e rotundas da pestilenta política dos enganos… Ademais a toda essa alcatéia de vorazes apadrinhados, resta-nos não vilipendiar nem ignorar os geniais assombros de produções amadoras pelos quatro cantos dessa pària mãe gentil aos forasteiros… O fazer cultural nunca será a arte dos enganos posto quê o seu povo tem arte e cultura entranhada nas veias através dos seus maledicentes e teimosos artistas com suas trupes mambembes desde as décadas mais longínquas e que até agora teimam em atravessar o tempo e as ruas dessa cidade que vergonhosamente nunca se permitiu através da Arte do teatro vivo valorizar e responder em respeito há suas várias gerações que aqui atuam e atuaram em favor da cultura e desse povo, e definitivamente vir a nos responder o porquê de nunca termos construído um Nobre Teatro e no entanto até a Casa da Cultura que chegou aos escombros de fato e as gerações culturais atuais e vindouras também nesse cenário nunca terão respostas de fato à esse vislumbre altruísta de fazer Teatro se não soubermos “Por quem os sinos dobram? Que nós resgate do atual cenário de Ostracismo.
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    Joildo Dante é Professor da Rede Pública e Poeta Escritor Estanciano, Ator intérprete e ativista nas causas Culturais e Sociais desde os idos anos 90.

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