Senado aprova projeto que obriga planos a cobrir tratamentos fora do rol da ANS
Proposta foi articulada em reação à decisão do Superior Tribunal de Justiça que limitou cobertura; texto vai à sanção
Pais, responsáveis e usuários de planos de saúde fazem protesto em frente ao STJ, em Brasília –
O Senado aprovou nesta segunda-feira (29) o projeto de lei que obriga os planos de saúde a arcar com procedimentos ou tratamentos que não estejam na lista de referência básica da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), colocando fim ao chamado rol taxativo. O texto vai à sanção presidencial.
A proposta resgata o rol exemplificativo e estabelece que a relação de procedimentos da ANS serve apenas de “referência básica” para os planos de saúde. Desta forma, os beneficiários poderão pedir a cobertura de tratamentos que não estejam na lista, desde que sejam reconhecidos por outras agências ou que haja comprovação científica.
O projeto de lei foi aprovado no começo de agosto na Câmara dos Deputados em reação à decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça). Em junho, o tribunal entendeu que as operadoras de planos de saúde são obrigadas a custear apenas os 3.368 tratamentos que estão na lista da ANS.
Apesar de integrar a base do governo de Jair Bolsonaro (PL) —que era contra a proposta—, o relator do texto, o senador Romário (PL-RJ), defendeu a derrubada do rol taxativo e manteve as mudanças aprovadas pelos deputados.
Romário afirmou que a decisão do STJ foi “injusta” e que, desde então, o Congresso buscava uma solução para acabar com a “insegurança jurídica” causada.
“Hoje é um dia histórico. Inesquecível. Um dia em que a sociedade brasileira se mobiliza e vence o lobby poderoso dos planos de saúde. Um dia em que o direito à vida e à saúde prevalece ante a ganância e a usura”, disse o senador.
Em seu parecer, Romário afirmou que a cobertura dos planos de saúde deve “prevenir, recuperar, manter e reabilitar a saúde, para todas as doenças listadas” na CID (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde).
“Dessa maneira, se o REPS [Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde] não contemplar integralmente esses direitos do paciente, poderão os beneficiários solicitar a cobertura dos tratamentos a eles prescritos, mesmo que não constem do referido rol”, escreveu no relatório.
O projeto também altera a lei que trata de planos de saúde —a Lei de Planos— para determinar que as operadoras sejam submetidas ao Código de Defesa do Consumidor, o que não acontece hoje.
Representantes de associações e familiares de pessoas com deficiência, autismo e doenças raras acompanharam a votação no plenário do Senado e comemoraram a decisão. Romário e senadores que defenderam o fim do rol taxativo foram aplaudidos.
“O rol taxativo impacta negativamente a vida de 48 milhões de usuários de planos de saúde. Atinge, especialmente, pessoas com deficiência, autistas, portadores de doenças raras. Não podemos inviabilizar o acesso da população a exames, terapias, cirurgias, fornecimento de medicamentos”, afirmou o senador Paulo Paim (PT-RS).
O projeto foi aprovado em caráter simbólico. Em meio à campanha eleitoral e à pressão das entidades, até mesmo senadores governistas saíram em defesa do fim do rol taxativo.
Na semana passada, durante sessão de debates temáticos no Senado, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, criticou a proposta. Ele argumentou que os planos de saúde terão mais custos, e que a conta será repassada aos consumidores.
Já o diretor-presidente da ANS, Paulo Rebello, afirmou que o rol taxativo é dinâmico, que os prazos para incorporação previstos na norma editada neste ano vão acelerar a análise de novos tratamentos e que a mudança na relação da agência causaria “desequilíbrio” no setor de saúde.
O QUE DIZ O PROJETO DE LEI
O projeto de lei afirma que o tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo que não esteja previsto no rol da ANS deverá ser autorizado pela operadora desde que:
- exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico;
- ou exista recomendação pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde);
- ou exista recomendação de, no mínimo, um órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais.
Durante a tramitação do projeto, senadores próximos ao setor sugeriram que a legislação dissesse que todas as condições eram necessárias para a cobertura do tratamento, e não apenas uma ou outra. A proposta foi recusada pelo relator.
Fonte: Folha de São Paulo